Meu ingresso numa universidade pública foi um divisor de águas na história de minha família. Imaginem só a filha de uma faxineira e de um frentista, migrantes do sertão das Minas Gerais, que estudaram apenas até a 4ª serie, terem uma filha que havia estudado somente em escolas públicas, que trabalhava de dia e estudava a noite, ingressando na USP aos 18 anos? Foi um momento único e sei que este acontecimento marcou a vida de meus pais, que sempre se orgulhavam em falar que a filha estudava na USP.
Antigamente havia o Jornal da Tarde, que semanalmente publicava o Caderno do Vestibulando. Eu, então com 17 anos, queria prestar vestibular para várias carreiras, até que li uma entrevista com uma bibliotecária do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME) e fiquei muito interessada no curso de Biblioteconomia. Escolhia a ECA por dois motivos: primeiro porque o JT destacava o curso da ECA/USP, e algumas das disciplinas oferecidas (História da Cultura e da Comunicação, Língua Portuguesa, Cultura Brasileira, Ação Cultural, Administração, Francês) eram exatamente o que eu queria aprender; segundo por ter realizado as provas do vestibular na Cidade Universitária, onde eu nunca tinha entrado. Ao olhar aquele campus lindo, cheio de árvores e flores, eu pensei “é aqui que vou estudar”. E deu muito certo.
Enfrentei desafios e todas as adversidades para conseguir ingressar na universidade pública, mas valeu muito a pena todo o esforço. Meu maior orgulho é ter estudado na ECA, ter vivido ali momentos de minha juventude que jamais esquecerei. Os amigos, os professores, a biblioteca, o CA, a lanchonete (palco de muitos encontros com professores e colegas de turma). Fazer parte da história da ECA é tão significativo que não tenho palavras para demonstrar minha alegria.
De todos os aprendizados que obtive, procuro sempre aliar as minhas atividades tradicionais da Biblioteconomia ao papel do bibliotecário como gestor do espaço de informação, além de não me esquecer das atividades culturais que o profissional pode desenvolver.
Essas habilidades agradeço à minha formação ecana e às aulas de Administração e Planejamento de Bibliotecas e História da Cultura e da Comunicação, que, aliadas à disciplina de Ação Cultural, mostraram-me muitas possibilidades de inserir atividades culturais no dia a dia de uma biblioteca, quer seja pública, escolar, universitária ou corporativa, e ao mesmo tempo ser o gestor do seu negócio, do seu espaço que é a biblioteca. Com os professores da ECA aprendi que a biblioteca não é apenas um acervo de livros, ela é muito mais que isso, é um espaço para promover a discussão, incentivar o aprendizado, um espaço democrático de fala e de escuta, um local de incentivo à leitura, de promoção do desenvolvimento profissional e pessoal, ou seja, um espaço transformador de vidas e histórias.
Um momento que muito me marcou foi saber que teria aula de Lógica com o professor Luis Barco. Eu sempre admirei sua coluna mensal desde que comecei a ler a revista Superinteressante na minha adolescência. Quando o vi entrar na sala pela primeira vez pensei: “Esta faculdade definitivamente é a minha cara, a minha casa”.
Atuo na área da Biblioteconomia desde 1995, sendo a maior parte em empresas. Acredito no desenvolvimento humano pela leitura e pela cultura, e esse atualmente é o meu propósito, estar em lugares de desenvolvimento visando um mundo melhor. Fui presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia, 17ª Gestão (2015-2017). Atualmente sou Consultora na área de Biblioteconomia, Mediadora Literária e de Grupos e também tenho um Clube do Livro. Minha empresa se chama Culturali: experimentando ideias.
Aluno | Turma | Curso |
---|---|---|
Carli Cordeiro | 1991 | Biblioteconomia |
Depoimento originalmente concedido a Luiz Milanesi em dezembro de 2016 por ocasião dos 50 anos da ECA e atualizado em junho de 2023 para inclusão no ÁgoraECA.